A globalização, a exigência do mercado em nos fazer turbinar o dia com trabalho, preocupações, estresse, nos afastam irremediavelmente do bem-estar e da essência de estarmos vivos, e, sobretudo, viver. Não é pleonasmo. Estar vivo não significa viver. Alguns apenas sobrevivem. O que eu quero dizer é que, o capitalismo destrói sonhos. É como se o dinheiro comprasse o teu prazer. No momento que o vende, o perde.
Há 40 anos a renda per capita era menor, o poder econômico era infinitamente mais moderado. Então, como explicar que o meu avô, marceneiro, pobre e dependente dos seus braços pro sustento diário da família, contribuiu com a construção de um estádio gigante?
Há quarenta anos não houve polêmica acerca de contratos milionários, tampouco financiamento público, procura minuciosa de parceiros endinheirados, executivos engravatados... nada.
Foi nos dado uma área no meio d’água, e ali se ergueu um gigante, com a força, os tijolos e os cimentos do seu povo.
Por isso é tão fácil aos outros trocarem de estádio. Aliás, na inauguração do estádio do rival, tomaram meia dúzia do Inter. Um estádio construído pela elite, como sempre foi. O nosso não. Tem um valor incomensurável. Não pelo que é, mas pela forma que se tornou. Um estádio que tem o suor do povo.
É por isso que meu avô estranha tanto, toda essa ladainha que envolve a reforma do Beira-Rio. Como os colorados de outrora fizeram de um rio, um estádio, e os de hoje, com mais conhecimento, mais quantidade, mais dinheiro, apenas consentem em ver uma construtora explorando os benefícios da nossa casa, estáticos, inertes, indiferentes?
Trocamos os tijolos dos marceneiros, como meu avô, pelos dólares dos mercenários, como essa construtora.
Hoje, nós, torcedores, não temos tempo, nem dinheiro, para manter o nosso Gigante. Trabalhamos muito e temos pouco tempo para investir na essência da vida. E acreditar nessa essência.
Posso dizer que meu avô era um mecenas assalariado que viu no Beira-Rio um investimento a longo prazo que o deu as maiores felicidades de sua vida. E ele não era um Andrade Gutierrez. Era um simples Pacheco da Rocha. Ele não se arrepende, e nem quer de volta os tijolos, só queria proporcionar ao seu grande amor, um lugar decente pra reinar.
E o pior de tudo? Esse jovem capitalista incoerente e paradoxal é a favor da parceria.
Postado por Fernando Rocha.
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